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sábado, 24 de dezembro de 2022

Campeão Paraense em 1949

 

Em termos de títulos, pode-se dizer que os anos 40 foram os piores da história do Clube do Remo. Depois do campeonato de 1940, os remistas ficaram intermináveis nove temporadas com o grito de "É campeão!" entalado na garganta. Nesse período viu o domínio dos rivais, Paysandu e Tuna, arremataram a totalidade das competições - excetuando 1946 em que não houve campeonato. A situação só começaria a mudar na segunda metade da década, depois do advento do profissionalismo (1945), do qual o Remo foi o precursor. 

Algum tempo depois, os frutos começaram a surgir. É nesse período, por exemplo, que vem jogadores como o uruguaio Veliz, goleiro que defendeu ferrenhamente por mais de 10 temporadas o arco azulino; o mineiro Jambo, um dos primeiros profissionais do estado, considerado o melhor “centro-médio” da época; e o baiano Quiba, o "mais perigoso meia-direita da cidade".

A esses importados juntaram-se os melhores valores da terra. A dupla de zaga, por exemplo, era composta por Expedito — o único remanescente do título de 1940 — e Isan, o mais completo marcador de “centro". Fazendo companhia a Jambo no meio, estavam Pelado e Muniz, ambos com histórico na Tuna, mas este último com experiencia em outros estados, como Pernambuco e Amazonas. Mas era o ataque, o ponto forte dessa equipe: além do já citado Quiba, o Remo contava com Gejú, Itaguari – os três no top 15 de maiores artilheiros azulinos na história –, além de Silvio, Marido e Jaime, que seria condecorado pela A Província do Pará, como o craque do ano do futebol paraense.

O Remo mostrou-se time versátil e perfeitamente ajustado em suas linhas. Praticava um futebol vistoso e eficiente, tanto é que acostumou-se a golear seus adversários, construindo seus placares logo no início dos jogos. Para se ter uma ideia, entre 1948 e 1949, o Leão venceu 12 dos 16 Re-Pa's que disputou, fazendo 48 gols e impondo acachapantes goleadas, como: 6 a 2 em 07/09/1948, 5 a 3 em 10/04/1949, 6 a 2 em 17/04/1949, 5 a 2 em 05/06/1949 e 5 a 3 em 13/11/1949. Detalhe: com exceção deste último jogo, todos ocorreram na Curuzu.

Essas vitórias foram o prenúncio do fim do jejum. Sob os comandos do vitorioso técnico Nagib Matni, os remistas mantiveram o desempenho no certame estadual. Auto Clube do Pará e Paulista foram presas fáceis; apenas os velhos rivais Tuna e Paysandu proporcionaram algum tipo de combatividade ainda no primeiro turno da competição. Mas no returno, não teve jeito, o Remo atropelou cada um dos demais participantes, credenciando-se para a final juntamente com o Paysandu.

Era a grande chance do Clube do Remo de reconquistar o cetro de campeão após quase uma década em branco. O confronto estava cercado por muitas expectativas. No Re-Pa do primeiro turno, o Paysandu levou a melhor por 1 a 0; mas no returno o Remo devolveu com juros, aplicando-lhe imponentes 5 a 3. Com uma vitória para cada lado, o tira-teima seria definido em uma melhor-de-três que, na realidade, acabou nem acontecendo.

Já no primeiro jogo, em pleno Natal de 1949, o Remo presenteou a sua torcida com uma vitória de 3 a 1 no Baenão, garantindo uma boa vantagem para a segunda partida, na Curuzu. Esta se deu já em 1950, dia 08/01. A Província do Pará do dia anterior se reportava ao jogo como o “choque-sensação”, onde, curiosamente, estariam “em luta os dois Leões”. Mas na Amazônia só existe um Leão e este mostrou toda a sua imponência. 

Mesmo que tenha sofrido uma certa pressão inicial dos adversários desesperados em reverter a desvantagem, o Remo soube se defender e abriu o placar aos 25 minutos do primeiro tempo, com Geju — substituto de Silvio naquela ocasião. Daí em diante, o Paysandu foi presa fácil. Jaime fez o segundo no final do primeiro tempo. Na segunda etapa, Jambo marcou de falta o terceiro logo aos quatro minutos; por fim, Jaime, novamente, fechou a goleada que ainda teve um tento de honra listrado. 

Com 7 a 2 no agregado, nem foi preciso o jogo-desempate. O Remo sagrou-se campeão paraense de 1949, com oito vitórias, um empate e uma derrota. Foi o desfecho do martírio azulino e o começo do bicolor, que passaria igualmente nove temporadas sem conquistar o troféu do estadual (1947 a 1956), aguentando o Filho da Glória e do Triunfo devolver os cinco títulos — bicampeonato em 1949/50 e tri em 1952/53/54 — e retomar a hegemonia no Pará.

A Província do Pará, de 10/01/1950, informou:

"Vitória da classe e do destemor — Abatendo o Paisandú, de 4 a 1 sagrou-se o Remo campeão de 49 - O cetro do futebol citadino foi parar às mãos dos azues, depois de uma jornada brilhante, em que o grande esquadrão do velho clube de Rubilar, de jôgo para jôgo, pôde evidenciar uma pujança verdadeiramente admirável. (...) Não foi a vitória remista à base de fatores outros, fortuitos e menos auspiciosos. Mas, isso sim, a vitória do mérito real, inconteste. Vitória da classe e do destemor. Uma linha reta entre a fôrça de vontade, o trabalho construtivo e a glória".

Nilo Franco, em sua coluna na mesma edição do jornal, escreveu sobre o título:

"O MAIOR... — (...) Depois de nove anos, volta-lhe o cetro dignificado por uma jornada realmente brilhante, engrandecido pelos feitos mais heróicos. E volta porque o Remo tudo soube fazer por conquistá-lo. Foi sempre e mais e mais a cada jogo um grande quadro cheio de indômita bravura, de admirável destemor, preliando com  classe e com dignidade. Foi, enfim, o maior".

terça-feira, 20 de dezembro de 2022

Campeão Paraense em 1940

 
Atletas azulinos saudando a torcida na vitória de 3 a 2 do Clube do Remo sobre o Paysandu, em 03/11/1940 (Folha do Norte).

Após a conquista do Campeonato Paraense de 1936, o Clube do Remo brigou com a Liga Atlética Paraense - regente do esporte no estado na época - e abriu mão de disputar o certame de 1937. Retornou no ano seguinte, mas não impediu o bicampeonato da Tuna. Já em 1939, o título ficou com o Paysandu que montou um dos seus grandes times, o chamado "esquadrão de aço".

Já era hora do Leão reassumir o protagonismo no estado. Então em 1940, os azulinos realizam uma ótima campanha no campeonato. Porém, os tropeços diante de Tuna e Paysandu — 1 x 2 e 1 x 1, respectivamente — colocam o Remo em desvantagem perante os seus maiores adversários na competição. E era justamente contra eles que se encerraria a campanha azulina naquele certame. Só a vitória interessava!

No dia 20/10/1940, o Remo se recupera e consegue a sua revanche contra a Lusa, vencendo-a por 3 a 2, no Souza. Com isso, o Leão ultrapassou os cruzmaltinos, ficando agora com três pontos perdidos contra quatro - era assim que se lia a pontuação na época, com a derrota contabilizando a perda de dois pontos e o empate, um. Todavia, o Clube de Periçá ainda estava atrás do Paysandu (um ponto perdido).

Diante disso, no Re-Pa programado para o dia 03/11 era de se esperar um certo favoritismo do lado bicolor, não apenas por estar à frente, mas também por jogar em casa, na Curuzu. Entretanto, os remistas não ligaram para isso e buscaram um grande triunfo, repetindo o placar de 3 a 2, gols de Bendelack e Vavá (2). Foi só aguardar a Tuna vencer o Paysandu por 3 a 1, em 19/01/1941, para o Remo confirmar o seu 14° (e último) título paraense do amadorismo. 

Ao que parece, mesmo ocupando o posto máximo do futebol paraense, o Clube do Remo foi alvo de críticas por precisar de uma combinação de resultados para ser campeão. Mas a Folha do Norte, de 21/01/1941, saiu em defesa do Filho da Glória e do Triunfo: 

"Muita gente que se perde nas nas alternativas do certame em relacionar os fatos, atribuiu essa conquista a uma simples questão de chance. Engano envolvendo flagrante justiça. Basta rememorar as etapas azulinas durante o campeonato, a ‘performance’ do quadro através de marcadores vultuosos, assegurando vitórias brilhantes, as condições em que chegou às finais, para que se considere o grande Clube merecedor do bastão futebolístico regional".

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

Campeão Paraense em 1968 (Invicto)

CLUBE DO REMO - CAMPEÃO PARAENSE EM 1968 (INVICTO)
Em pé: Jorge, Alemão, China, Casemiro, Ângelo e Edilson;
Agachados: Birungueta, Robilotta, Amoroso, Celso e Zequinha.

O título paraense de 1968 é um mais emblemáticos da história. Primeiro pelas circunstâncias em que se sucederam o vice no anterior,  no qual em uma série de Re-Pa's seguidos, o Clube do Remo sagrou-se campeão do segundo turno, mas não foi capaz de evitar o tricampeonato do rival. Portanto, reconquista do estadual era prioridade máxima nos arraias azulinos.

Para tanto, o Remo vendeu o zagueiro Assis para o Fluminense-RJ por NCR$ 80.000,00 e aproveitou para comprar em definitivo o atacante Amoroso, que estava emprestado ao Leão pelo clube carioca. Amoroso fora destaque remista em 1967, tornando-se artilheiro do Parazão com 19 marcados. Além disso, o Mais Querido atravessou Robilotta, goleador do Paysandu no tricampeonato de 1965-66-67. 

Com esse ataque infernal, o Mais Querido atropelou os seus adversários. Enfrentando Combatentes, Tuna, Sacramenta, Sport Belém e Paysandu, em jogos de turno e returno, os azulinos venceram nove jogos seguidos, conquistando o primeiro turno nesse percurso e chegando à última partida, contra o Paysandu, no dia 14 de julho de 1968, precisando apenas de um empate para conquistar o troféu.

A expectativa era tamanha que mesmo o jogo sendo na Curuzu, a torcida azulina era maioria. Todas as atenções da imprensa esportiva estavam voltadas para a possibilidade do título azulino, que se tornou ainda mais provável quando Amoroso abriu o placar aos 21' do primeiro tempo, atirando no canto esquerdo da meta do goleiro bicolor Omar.

Entretanto, o Paysandu reagiu e virou o escore através dos gols de Hélio Cruz aos 40' do primeiro tempo e Edinho, ex-azulino, aos 12' do segundo. Por sorte, quando o ponteiro marcava 37', novamente Amoroso, fazendo jus ao seu apelido "Pé de Coelho", em lance de extrema perspicácia e oportunisto, aproveita a bobeira da defesa bicolor e consegue o oportuno empate. O único jogo daquele campeonato que o Remo não venceu, mas que lhe valera o título.

"A Província do Pará" assim descreveu o lance:

"A bola vai à linha de fundo. Tiro de méta para o Papão. Omar dá para Abel que devolve. Amoroso vivo, inteligente, entra no lance, rouba a bola e atira para a meta desguarnecida, sôbre espanto dos dois jogadores alvi-azuis e alegria dos remistas. Era o goal do empate, o goal do campeonato. (...) Remo, campeão invicto de 1968! Um ponto perdido apenas!".

Segue a "A Província": 

"A culminar uma campanha particularmente brilhante, a equipe de profissionais do Clube do Remo manteve a sua condição de invicta e, empatando a 2 tentos com o Paissandu, conquistou o título regional de 1968. As peripécias do jôgo - como as de todo o campeonato - mostrou a equipe 'azulina' fortalecida, de alma lavada, destemida e preparada para enfrentar a luta com espírito de desportivismo. Um campeão sem mêdo e sem mácula! Marcou um goal, cedeu o empate, estêve depois em desvantagem, mas serenamente, sem perturbações conscientemente soube lutar por nova igualdade, para conquistar o título. Houve ansiedade e emoção entre o público, lágrimas de alegria do atleta brioso e lutador, após o término da partida, e a alegria efuziante que se espalhou por tôda cidade. Nas fotos, dos reporteres Airton Quaresma e Fernando Seixas, os lances dos dois goals do Remo (Amoroso), a apreensão estampada na fisionomia 'dum' remista quando o Remo perdia por 2 x 1, Birungueta chorando de emoção, depois de lhe terem levado a camisa e a expressão de alegria na passeata da vitória".

O esquadrão campeão invicto era formado por Jorge; Alemão, China, Casemiro,  Angelo e Edílson; Birungueta, Robilotta, Amoroso, Celso e Zequinha. 

segunda-feira, 1 de agosto de 2022

O Heptacampeonato

CLUBE DO REMO — HEPTACAMPEÃO PARAENSE EM 1913/14/15/16/17/18/19

Pode-se afirmar, sem dúvida alguma, que o futebol do Clube do Remo já nasceu glorioso. A sua introdução no quadro esportivo azulino em 1913 se deu em um contexto de reestruturação do Campeonato Paraense, que voltaria a ser disputado naquela temporada após dois anos, graças à criação da Liga Paraense de Foot-Ball. E logo na sua primeira participação, o "football team" do Grupo do Remo, formado por "sportmen" já acostumados com as vitórias nas águas, sagrou-se pela primeira vez campeão paraense. Mas não parou por aí: soberano em todos os aspectos, o Remo emplacou o heptacampeonato, a maior sequência de títulos da história do Campeonato Paraense de Futebol.

1914 — BICAMPEÃO 

Estado do Pará, 24/01/1915

O campeonato de 1914 adotou uma fórmula de disputa que se perpetuaria, sendo organizada em duas fases. Na primeira ("turno"), os participantes se enfrentavam jogos de "ida", sendo que aqueles que somassem mais pontos — geralmente os quatro melhores —, classificavam-se para a segunda fase ("returno"), disputada da mesma forma, na qual o primeiro colocado seria coroado com o título. Eventualmente, em caso de igualdade de pontos, uma partida decisiva extra poderia ser necessária.

O Remo começaria a sua defesa pelo título de campeão paraense no dia 14/06/1914. O adversário azulino era nada menos que o seu futuro rival, o Paysandu, fundado em fevereiro daquele ano por ex-integrantes do Norte Club inconformados com os acontecimentos da temporada anterior. Aquela ocasião também marcava a inauguração do estádio da firma Ferreira & Comandita (atual Curuzu), que passou a ser o principal local de jogos. O primeiro Re-Pa da história terminou com vitória remista por 2 a 1, gols de Antonico e Bayma (contra).

No decorrer do turno, o Remo ainda venceu o União, o Guarany, o Aliança, o Brasil e o Ypiranga, além de um resultado desconhecido contra o Panther, que presume-se ter sido um triunfo azulino. Além do Remo, classificaram-se para a etapa seguinte o União, o Paysandu e o Panther.

No returno, o Remo voltou a vencer o Paysandu, dessa vez por 3 a 1, em 06/12/1914, com um hat-trick de Antonico. Apesar de ser a estreia de ambos no returno, esse jogo foi tratado como o decisivo para o título de campeão. No fim das contas, acabou sendo mesmo, pois, posteriormente, em reunião realizada no dia 16/12/1914, a Liga resolveu anular os jogos Panther x União (29/11) e União x Paysandu (12/12), cada um com as suas irregularidades específicas. Diante dessa decisão, tanto o Paysandu, quanto o Panther, abandonaram a disputa. O jogo restante, entre Remo e União chegou a ser anunciado para o Natal daquele ano, mas não se sabe se chegou a realmente ocorrer. 

A única certeza era: Remo, Bicampeão Paraense!

Estado do Pará, de 05/12/1914, se reportando ao Re-Pa do dia seguinte que decidiria o campeonato

1915 — TRICAMPEÃO

"Time do Clube do Remo, já vitorioso desde 1915". A História do Clube do Remo, de Ernesto Cruz, 1969

O ano de 1915 fomenta a rivalidade entre Remo e Paysandu. Além de perder a sua invencibilidade em clássicos, o Remo decidiu romper as relações amigáveis que mantinha com os bicolores, após ser destratado por eles, em um ofício-resposta a um convite azulino para um "match-desafio" no mês de fevereiro. Esse fato contribuiu para que a "rixa" entre os clubes, que já eram considerados os principais da cidade e disputavam a preferência clubística dos belenenses, ficasse ainda mais acirrada.

Coincidentemente, o jogo de abertura do Campeonato Paraense daquele foi justamente o Re-Pa, no dia 03/05/1915. Mesmo com o Paysandu considerado mais forte tecnicamente naquele momento, o Remo conseguiu segurar o empate contra o rival. Esse resultado foi essencial, pois poderia representar um desequilíbrio mais à frente. Afinal, os outros participantes da competição — União Sportiva, Panther, Guarany e Brasil — não forneceram perigo algum a Remo e Paysandu, de tal forma que ambos venceram todos os seus jogos subsequentes.

Todavia, quase que essa sequência de vitórias não se concretiza. No quarto jogo do turno, em 01/08/1915, o Remo venceu o Brasil por 1 a 0, porém, no dia 04/09, a Liga resolveu anular esse resultado, conferindo empate para ambos. O Remo ameaçou desfiliar-se da Liga. Em gesto nobre, o Brasil abriu mão da decisão, sugerindo a remarcação do jogo, que assim se sucedeu no dia 07/11. Dessa vez, o placar não deixou dúvidas: Remo 9 x 0 Brasil. Curiosamente, os azulinos já vinham de dois 9 x 0 seguidos, contra Guarany e União Sportiva.

Ao chegar na fase derradeira, azulinos e bicolores apresentavam campanhas praticamente idênticas — sete vitórias e um empate, com vantagem do Paysandu no saldo de gols. Assim, no último e decisivo jogo, o Re-Pa do dia 19/12/1915, nada mais interessava ao Remo se não a vitória. Diante de um grande público, que lotou as dependências do estádio da firma Ferreira & Comandita, o Clube do Remo foi taticamente perfeito e muito superior ao rival, sabendo aproveitar as suas fragilidades. Assim se construiu um verdadeiro massacre azulino: 5 a 1 e o primeiro Tri da história!

Estado do Pará, 20/12/1915

O mais curioso disso tudo é que, apesar de todos os acontecimentos anteriores, os bicolores resolveram participar da carreata comemorativa ao título azulino, um fato impensável nos dias atuais. Essa atitude talvez possa ser interpretada como um pedido de desculpas, como relatou a Folha do Norte, de 20/12/1915: 

“(...) acompanhavam-nos os valentes rapazes do Paysandu Sport Club. Registramos o fato com muita satisfação por vermos que neste momento importante para o Pará desportivo, os nossos foot-ballers num congraçamento feliz, dão trégua a pequenos ressentimentos pessoais e, vendo o progresso do esporte, pugnam unidos pelo bom nome de nossa terra”.

1916 — TETRACAMPEÃO 

No início da temporada, o Clube do Remo disputa seu primeiro jogo de caráter interestadual. Porém, a busca pelo tetra se inicia apenas em 21 de maio de 1916 com impiedosos 5 a 0 no Aliança, seguido de um 2 a 0 sobre o Panther. Depois, os azulinos - até então invictos em jogos oficiais - conheceriam a sua primeira derrota: 1 a 2 diante do União Sportiva, no dia 9 de julho, sendo que o Remo ainda teve um pênalti desperdiçado por Armindo. Mas a recuperação foi avassaladora, com goleadas sobre o Guarany (5 a 0), Aliança (5 a 1) e a vingança contra União (7 a 0). A campanha do quarto título consecutivo se encerrou com as vitórias de 3 a 0 sobre o Guarany e 1 a 0 sobre o Panther.

Como se observa, o Clube do Remo conquistou o primeiro tetracampeonato da história do futebol paraense sem ter jogado contra o seu maior rival, o Paysandu. Isso se deu porque o clube bicolor resolveu abandonar o campeonato por divergências com a Liga Paraense de Foot-Ball (LPF). Como forma de reconciliação, a LPF criou a taça Lauro Muller, a ser disputada entre Remo e Paysandu, no dia 15 de outubro de 1916. A ocasião contou até com a presença do Governador do Estado na época, o sr. Éneas Martins. É óbvio que o ano não poderia acabar sem um triunfo remista no Re-Pa. Demonstrando a sua autoridade de campeão, o Remo venceu por 3 a 0.

Estado do Pará, 16 de outubro de 1916

1917 — PENTACAMPEÃO

Após uma intertemporada de descobrimento de outras terras, com excursões a São Luís (MA) - a primeira interestadual da história azulina - e Recife (PE) - onde conquistou um troféu relativo ao Centenário da Revolução Pernambucana de 1817 -, o Clube do Remo voltava as suas atenções para manter a hegemonia na sua. No dia 1° de julho de 1917, os azulinos estrearam no Campeonato Paraense vencendo o União Sportiva com por 3 a 0. Ainda nesse período, faria mais dois jogos: 3 a 3 com o Paysandu e impressionantes 13 a 0 sobre o Fênix. Mas o grande momento do clube viria no mês seguinte.

Em 15 de agosto de 1917, quando completava seis anos de Reorganização, o Clube do Remo inaugurou o seu "campo de sports" - futuro estádio Evandro Almeida, o Baenão. Na ocasião, foi disputado um jogo entre a Seleção da Liga Paraense de Esportes Terrestres (LPET) e o time da Reserva Naval. O primeiro jogo do Clube do Remo em seu estádio só ocorreria em 2 de setembro de 1917, quando venceu o Panther Club por 3 a 1. Antes, os azulinos já haviam vencido o Fênix Sport Club por 5 a 3 no dia 19 de agosto, mas ainda no campo da empresa Ferreira & Comandita. 

Na sua nova casa, o Remo não perdeu mais, aplicando 6 a 0 no União Sportiva, 3 a 1 no Brasil Sport-Club e 6 a 1 no Nacional – antigo Panther, que mudou seu nome no dia 18 de outubro daquele ano –; e empatando em 1 a 1 com o Paysandu no domingo de Círio (14 de outubro). Curiosamente, apenas a goleada de 9 a 0 sobre o Fênix, em 28 de outubro, e o jogo que garantiu o pentacampeonato não foi no estádio azulino: Remo 3 a 1 Paysandu, em 16 de dezembro de 1917, na Ferreira & Comandita, gols de Dudu, Chermont e Rubilar.

Estado do Pará, 16 de dezembro de 1917

1918 — HEXACAMPEÃO 

O Campeonato Paraense de 1918 correu o risco de não ter um desfecho. O motivo foi a disseminação vírus influenza H1N1, causador da Gripe Espanhola, pandemia que gerou milhões de mortes no mundo inteiro. Apesar do nome, sugere-se que a gripe tenha iniciado entre as tropas britânicas situadas na França em fins da Primeira Guerra Mundial ou até mesmo nos Estados Unidos. De qualquer forma, a pandemia chegou ao Brasil pelo Nordeste em setembro de 1918 através do navio inglês “Demerara",  se propagando para a capital paraense. 

Como consequência, no intuito de evitar a propagação do vírus, o campeonato teve que ser paralisado entre outubro e novembro de 1918. Até aquele momento, o Clube do Remo já havia disputado seis jogos. Estreou goleando o Luso Brasileiro por 10 a 0 no dia 3 de maio. Em seguida, empatou com o Brasil em 1 a 1 e emplacou uma sequência de vitórias – 8 a 0 no Nacional, 4 a 2 no Paysandu, 4 a 2 no União Sportiva e 8 a 0 no Luso Brasileiro, em 6 de outubro, o último jogo antes da paralisação.

Estado do Pará, 24 de novembro de 1918

No dia 24 de novembro, o Estado do Pará anunciou o reinício do campeonato com os jogos Remo x União Sportiva e Paysandu x Brasil Sport, mas não se tem notícia posterior do placar dessas partidas nem mesmo a comprovação se ambas foram realizadas. Caso a “pugna" realmente tenha acontecido, presume-se que tenha sido vencida pelos azulinos, já que, segundo o mesmo jornal, o jogo seguinte, entre Remo e Paysandu, no dia 15 de dezembro, no Baenão, era o “encontro decisivo do campeonato". 

Estado do Pará, 15 de dezembro de 1918

Conta ainda Estado que o Remo possuía um ponto acima do Paysandu na tabela. Considerando-se que uma vitória valia dois pontos e o empate, um; que o time bicolor havia perdido apenas um jogo – contra o próprio Remo – e vencido todos os outros; e que o Remo já havia empatado antes contra o União em 1 a 1; o resultado mais provável para o jogo do dia 24 de novembro seria a vitória azulina. 

De todo modo, o que interessa mesmo é a “final". Pela posição privilegiada, o Estado do Pará ressaltou que “mesmo um empate dará mais uma vez o glorioso título ao conjucto azulino". E foi o que aconteceu. Da forma mais pragmática possível, um empate seco, sem gols, proporcionou o hexacampeonato de futebol, uma façanha que nenhuma outra agremiação na centenária história do Campeonato Paraense conseguiu. E essa conquista é ainda mais especial, pois foi a primeira das muitas obtidas no solo azulino do Baenão.

1919 — HEPTACAMPEÃO 

O Remo já havia conquistado aquilo que nenhum outro time paraense conseguiria. Mas ainda não era suficiente. E foi essa gana que resultou na conquista do sétimo título estadual consecutivo em 1919, o inigualável heptacampeonato, o estabelecimento definitivo do Reinado Azul, que se estenderia ao longo de todas as décadas posteriores. Além disso, a consagração para eternidade dos primeiros heróis azulinos, que tem nas pessoas do inabalável defensor Lulu e do polivalente atleta Rubilar, os únicos presentes em toda essa caminhada vitoriosa, as suas mais gloriosas e celebradas figuras.

Apesar de todo o peso e importância desse feito, ironicamente as informações acerca da jornada vitoriosa são incompletas. Sabe-se que o Clube do Remo iniciou a sua campanha no dia 1° de junho de 1919, da melhor forma possível: 12 a 1 no Luso-Brasileiro. Prosseguiu com vitórias de 5 a 1 sobre o Nacional, 2 a 1 sobre o Paysandu e 4 a 0 sobre o União, sendo que o Re-Pa, disputado em 6 de julho, foi bastante tumultuado, contando com a expulsão do bicolor Suíço e o abandono do seu time de campo – um costume antigo.

Porém, a partida que fechou o turno contra o Brasil Sport, além dos jogos do returno contra Luso-Brasileiro e Nacional, infelizmente, não tem seus resultados conhecidos. Mas o jogo seguinte, o Re-Pa de 5 de outubro, sim. Dessa vez os bicolores não fugiram de campo... Preferiram nem comparecer, tendo notificado a decisão à LPET no dia anterior. O Remo então venceu por WO e manteve o tabu de sete anos sem derrotas em Re-Pa's oficiais. Depois ainda triunfou sobre o União Sportiva por 4 a 0 e sobre o Brasil Sport por 2 a 1, finalizando a sua campanha já em 4 de janeiro de 1920.

Tabela veiculada pelo Estado do Pará, de 5 de outubro de 1919, que até então o Remo jamais havia perdido um Re-Pa oficial, válido pelo Campeonato Paraense

Com base nisso, presume-se que o Remo tenha conquistado o título por possuir maior número de pontos, já que, dos jogos comprovados, os azulinos venceram todos e o seu principal rival, o Paysandu, não mostrou poder de competividade. Notícias posteriores se referem ao Remo como o campeão daquele ano. Inclusive, a conceituada revista carioca Vida Sportiva, na sua edição de número 138, de 17 de abril de 1920, estampou o Esquadrão Azulino em sua capa com a seguinte legenda: “Team do Club do Remo, de Belém, Pará, que é o campeão do norte do Brasil".

domingo, 31 de julho de 2022

O Primeiro Título no Futebol

Em 1913, nas pessoas dos Srs. Galdino Araújo e Adolpho Silva, o Grupo do Remo participou do movimento instaurado pelos clubes e desportistas da época para reorganizar o futebol paraense, que já estava há dois anos sem disputa de campeonato. Desse processo, surgiu a Liga Paraense de Foot-Ball em 25/05/1913, em reunião realizada na Rua da Indústria (atual Rua Gaspar Viana), nº 1. O local era o escritório do inglês T. H. White, que foi eleito presidente da entidade, tendo os Srs. D’Artagnan Cruz e Smith como secretário e tesoureiro, respectivamente. 

A fundação da Liga Paraense de Foot-Ball. Estado do Pará, 27/05/1913

A Liga iniciou os preparativos para a realização dos Campeonatos da Primeira e Segunda Divisões. Entre eles, estava a concessão de uma área de 200 metros de comprimento por 90 metros de largura, na Praça Floriano Peixoto, no Largo de São Braz, atendida pelo Intendente Municipal de Belém, Dr. Dionysio Bentes. O local foi cercado por vigas de acapu e ligadas por um cabo de arame, além da construção um palanque provisório de seis metros de comprimento por três metros de largura para as autoridades e famílias assistirem às partidas.

O campeonato contou com as participações do Grupo do Remo, do Guarany, do Panther Clube, do União Sportiva, do Internacional de Foot-ball Association e do Norte Club. As partidas eram disputadas entre 14h e 18h para aproveitar a luz do sol já que não existia um sistema de iluminação para jogos à noite. 

O sistema de disputa era o mesmo implementado pela Football Association, da Inglaterra: pontos corridos — dois pontos em caso de vitória e um ponto se empate —, sendo campeão o time que somasse mais pontos ao final da competição. O jogo inaugural foi o empate de 2 a 2 entre União Sportiva e Internacional em 29/06, que contou com a presença do Intendente, Dionysio Bentes, e do Governador do Estado, Enéas Martins.

A estreia do Grupo do Remo se deu no dia 14/07/1913, uma segunda-feira. O jogo em questão foi aguardado com muito entusiasmo pela imprensa e pela numerosa torcida que compareceu à cancha, já que seria contra o valoroso União Sportiva, até então, bicampeão estadual. Entretanto, esse cartaz não intimidou os atletas azulinos, já acostumados com os grandes desafios desde as disputas náuticas. Isso refletiu no desempenho dentro de campo. Os remistas fizeram um jogo calmo e preciso, priorizando a aplicação tática entre as suas linhas, suplantando totalmente os unionistas que se limitaram a um jogo individual e descoordenado.

Coube ao capitão Antonico abrir o placar a favor dos azulinos, quase no final do primeiro tempo. O União partiu em busca do empate, mas a defesa remista estava esplêndida, rechaçando qualquer investida. No segundo tempo, mais uma vez Antonico, pela extrema-direita, vaza o gol adversário. Nesse embalo, Nahon marcou mais duas vezes a favor do Grupo do Remo. Quando faltavam apenas dois minutos para o apito final, Oscar diminuiu, mas a goleada já estava decretada: Grupo do Remo 4 x 1 União Sportiva.

Estado do Pará, 16/07/1913

A primeira equipe oficial era composta por: Bernadino; Galdino e Lulu; Carlito, Aimée e Chermont; Rubilar, Antonico, Nahon, Infante e Dudu. O jornal O Estado do Pará, de 16/07/1913, ressaltou os destaques do time azulino: 

Bernardino, como sempre, bom; Galdino e Lúlú, temíveis em suas linhas; Aimée, admirável e terrível naquella posição difícil de ‘center-half', foi um elemento magnífico na defesa ao lado de Carlito e Chemont que também contribuíram com uma bôa parcella de esforços para a formidável victoria do club. Da linha de ‘forwards' todos bons, salientando-se Nahon e Antonico que ‘marcaram’ os 4 ‘goals'".

Tabela do campeonato após a estreia azulina. O Grupo do Remo assumiu a ponta e não largou mais. Estado do Pará, 16/071913

No prosseguimento da competição, o Remo foi limando um a um os seus adversários. Emplacou uma sequência de vitórias, com os 4 a 0 sobre o Guarany, os 3 a 2 sobre o Panther, os 2 a 1 sobre o Internacional... Foi então que os azulinos conheceriam o seu grande adversário: o Norte Club, também chamado de Time Negra devido à cor da sua camisa. 

O embate entre ambos foi marcado para o dia 05/10/1913, um domingo. O jogo era o mais aguardado da temporada, pois envolvia as duas melhores e mais vitoriosas equipes, sendo tratado como o encontro decisivo do campeonato. Até aquele momento, o Remo era o líder com oito pontos — quatro vitórias em quatro jogos — enquanto que o Norte Club possuía seis — três vitórias em três jogos.

Dada a importância da partida, os times se prepararam com antecedência. O Remo era considerado favorito por ter os melhores “elementos” da “velha guarda", com mais experiência nos fundamentos técnicos, especialmente no chute e drible, graças aos treinos de seu rigoroso capitão Antonico, além de um maior cartel de vitórias. Já o novato Norte Club era composto em sua maioria por estudantes, cujo capitão era Hugo Leão, que seria o principal fundador do Paysandu.

Como já era esperado, Remo e Norte travaram um belíssimo embate. Segundo O Estado do Pará, de 07/10/1913, ainda não havia ocorrido um matchtão correctamente jogado, tão enthusiasmado e tão bem desenvolvido”. Diante de numerosa assistência, o confronto foi equilibrado, mas quem saiu na frente foi o Remo, em jogada que se iniciou de uma cobrança de escanteio. O zagueiro “camisa-preta" Moraes tirou de cabeça e, da mesma forma, o azulino Chermont rebateu a bola, que fora defendida por Sylvio, no canto. Com a confusa disputa dentro da área, a bola acabou entrando para o fundo das redes. No segundo tempo, Hugo Leão empatou o jogo em 1 a 1.

Esse seria o único “tropeço” do Remo no campeonato, ainda havendo tempo para vencer o Belém Sport por humilhantes 10 a 0, em 26/10. Assim, foi só aguardar o empate entre Norte Club e Guarany em 1 a 1, em 15/11, para que o Grupo do Remo não tivesse mais chances de ser alcançado e, consequentemente, ser declarado Campeão Paraense Invicto de 1913.

Todavia, o Norte Club ainda recorreu à justiça para tentar anular o seu jogo contra o Guarany. Felizmente, no dia 20/11, a Liga julgou esse recurso improcedente, mantendo o resultado e, por tabela, o primeiro título azulino da história. Mas esse fato geraria consequências no futuro...

Na condição de Campeão Paraense, o Grupo do Remo só seria devidamente premiado no dia 20/02/1914, quando recebeu das mãos do Dr. Gama Malcher, presidente da Liga, uma bela taça importada da Alemanha pela firma Krause, Irmãos e Cia. Medindo 60 centímetros de altura e 700 gramas de peso, a taça descansava sobre um pedestal de cedro que continha uma placa com os dizeres: “Liga Paraense de Foot-Ball – Campeonato de 1913”, repousando num estojo de veludo roxo.

O futebol azulino já nasceu campeão!

Foto reproduzida pela revista Caraboo, ano III, nº 30, de 05/02/1916, cuja legenda diz: “CLUBE DO REMO — Primeiro team de football no início da temporada de 1914”.

quinta-feira, 14 de julho de 2022

Tricampeão Paraense em 1975 (Invicto)

CLUBE DO REMO - TRICAMPEÃO PARAENSE INVICTO EM 1973/74/75

Visando consolidar de vez a sua soberania no estado, o Clube do Remo repatriou o técnico Paulo Amaral, que havia treinado o time no segundo semestre de 1973. O primeiro teste foi a conquista de um torneio internacional, arrematado após vitórias sobre Robin Hood, do Suriname, por 5 a 2, Tuna por 2 a 0 e Paysandu por 1 a 0, gol de Dutra, no dia 2 de março de 1975, no Baenão. 

Duas semanas depois, o Remo estreava no Campeonato Paraense com um passeio sobre o Sporting (7 a 0) e se manteve 100% até o último jogo da primeira fase do primeiro turno - os turnos eram divididos em duas fases -, quando empatou em 1 a 1 no Re-Pa de 27 de abril. Na fase final, vitória sobre Castanhal (4 a 0), empate com a Tuna (1 a 1) e vitória diante do Paysandu (1 a 0), esta em 25 de maio, deram o título ao Leão Azul.

No returno, a tônica foi a mesma. Na primeira fase, quatro vitórias e um empate. Já na fase final, após os 5 a 0 sobre o Castanhal e 1 a 0 sobre a Tuna, bastou um empate sem gols contra o Paysandu no dia 23 de julho, no Baenão, para o Remo sagrar-se campeão do segundo turno.  Logicamente, nessa condição o Leão teria que ser consagrado campeão paraense... Mas não foi o que aconteceu. 

Acontece que devido ao esdrúxulo regulamento, mesmo tendo arrematado os dois turnos, o Remo ainda não havia garantido o título. No máximo, teria a vantagem do empate na grande decisão contra o Paysandu, vice nas duas etapas anteriores. Caso perdesse, uma outra série decisiva seria disputada.

Chega então a memorável data de 3 de agosto de 1975. O Baenão, palco da peleja histórica, estava completamente tomado por exatos 29.940 torcedores, um dos maiores públicos do Evandro Almeida em todos os tempos, que pulsou quando adentraram em campo Dico; Rosemiro, Dutra, Rui e Cuca; Elias e Roberto; Prado, Mesquita, Alcino e Amaral. A Máquina Azul comandada por Paulo Amaral.

Com a bola rolando, o que se viu foi um Remo inicialmente jogando com o regulamento embaixo do braço, enquanto que o Paysandu, apesar de retraído no começo, se aproveitou da apagada atuação de Roberto no meio-campo, sobrecarregando Elias, necessitando que Mesquita viesse ao seu auxílio. Isso diminuiu o poder fogo azulino e facilitou para os bicolores, que perderam oportunidades de sair com a vitória no primeiro tempo.

Na volta do intervalo, os listrados se lançaram ao ataque, mas após a defesa azulina rechaçar, Elias lançou Roberto, que, marcado por Waltinho e Gilberto, e fez um belo corta-luz para Mesquita finalizar no canto e inaugurar o placar aos 45 segundos, quase colocando o Baenão abaixo com a explosão da torcida. Aos oito minutos, após jogada de Prado, Rosemiro lançou para Alcino, que dominou com muita categoria no peito, abriu para Mesquita que fuzilou o arco adversário. Reginaldo rebateu e Alcino aproveitou, marcando o seu 21° gol e se tornando, pela terceira vez consecutiva, o artilheiro do campeonato.

O gol do título

O Paysandu até descontou e chegou ao empate através de Bacuri, mas como ele estava impedido, o árbitro Saul Mendes anulou o gol, mantendo os 2 a 1 que perdurou até o final da partida. A vitória do Remo foi mais que merecida. Naquele dia, o Filho da Glória e do Triunfo chegara ao seu 51° jogo em três anos sem saber o que era uma derrota no Campeonato Paraense. Um feito único no Brasil. Um tricampeonato invicto que seria eternizado com as primeiras estrelas acima do escudo azulino.

A Máquina tricampeã invicta!

sábado, 25 de junho de 2022

Bicampeão Paraense em 1974 (Invicto)

CLUBE DO REMO - BICAMPEÃO PARAENSE INVICTO EM 1974

A edição de 1974 do Campeonato Paraense foi, talvez, a mais disputada de todos os tempos, muito em função do seu excêntrico regulamento, dividido em três turnos. Acontece que o desenrolar dessa fórmula possibilitava uma condição ainda mais única e especial: o Supercampeonato, disputado entre os vencedores de cada turno para, enfim, se definir o campeão paraense. E foi o que aconteceu.

O primeiro turno foi vencido pelo Paysandu, enquanto que o Remo levou o segundo. Já o terceiro teve como ganhadora a Tuna, em uma decisão emocionante contra o Leão, que merece um destaque a mais. Depois de empatarem em 1 a 1 no tempo regulamentar e em 2 a 2 na prorrogação, a Lusa levou o título apenas na segunda série de penalidades, ganhando por 10 a 9 - Marinho foi quem perdeu para o lado azulino -, naquele que, possivelmente, foi o jogo mais longo da história do Parazão.

Mas aqui cabe uma ressalva. Mesmo com esse revés nas penalidades, o Remo não perdeu a invencibilidade na competição. Afinal, a disputa de pênaltis não entra nas estatísticas dos times e jogadores, por ser um procedimento que não faz parte, de fato, da partida, prevalecendo o resultado final (empate). 

Com o Supercampeonato definido, o Trio de Ferro inicia a briga pelo título máximo do futebol paraense. O Remo assistiu de camarote o empate de 0 a 0 entre Paysandu e Tuna no dia 11 de dezembro de 1974, que abriu o Super. Diante desse resultado, uma vitória sobre os bicolores no dia 15, no Baenão, colocaria o Leão em vantagem na disputa.

Naquele Re-Pa acabou prevalecendo a lógica. O Remo venceu por 2 a 0, com gols de Alcino aos 33' do primeiro tempo e Mesquita aos 7' do segundo. A emblemática vitória não apenas sepultou as chances dos bicolores, como também marcou o melancólico fim da "geração do Quarenta" do rival, que se sobressaía desde a segunda metade dos anos 50. O invencível Leão Azul, sob os comandos de Paulinho de Almeida, representava os novos tempos no futebol paraense e partia em busca de mais de mais um título invicto.

Sob às vistas de Rosemiro, Alcino comemora o seu gol, que inaugurou o placar diante dos bicolores, aos 33 minutos do primeiro tempo. Mesquita,  aos 7' do segundo, fechou a contagem ("A Província do Pará", 16 de dezembro de 1974

Em um cenário muito semelhante ao ano anterior, após eliminar o maior rival, o Remo precisava apenas de um empate no dia 18 de dezembro, contra a qualificada Tuna de Miguel Cecim para sagrar-se campeão. Mas, diferentemente, a vitória veio com um gol memorável de Alcino, imortalizado pelas lentes do repórter Braz da Rocha ("A Província do Pará") e relembrado nesse relato emocionante do apaixonado torcedor azulino Rocildo Oliveira:

"35 minutos do segundo tempo, a experiente equipe do professor Paulinho de Almeida arma o contra ataque. A bola chega aos pés do veloz e habilidoso ponteiro-esquerdo Neves que levanta a cabeça e lança o balão de couro para o interior da grande área. Por um segundo o torcedor emudece, com o seu olhar atento segue a trajetória da bola, que muito antes de tocar o chão é alcançada pela testada fulminante, do gigante azulino Alcino. O silêncio sepulcral da lugar a uma explosão de risos e choros. O grito de gol ecoava por toda Belém, por todo Estado do Pará...".

O voo do gigante! Momento exato do gol de Alcino, flagrado pelas lentes de Braz da Rocha. Na imagem ainda é possível observar os tunantes Reginaldo (goleiro), Carvalho (zagueiro), Oliveira Pipoca (lateral-esquerdo), o lateral-direito azulino Rosemiro, além, é claro do inalcançável Alcino

Esse foi o 12° de Alcino, que tornou-se artilheiro da competição e fez explodir o Baenão completamente lotado após a conquista de mais um campeonato. Em outra campanha sensacional, o Clube do Remo venceu 12 jogos e empatou seis, marcando um total de 28 gols e sofrendo apenas cinco. Números espetaculares que consagraram o Filho da Glória e do Triunfo como o superbicampeão paraense de 1974.

O time superbicampeão. Em pé: Rosemiro, Elias, China, Dico, Rui Azevedo e Cuca. Agachados: Caíto, Nena, Alcino, Roberto e Neves

quinta-feira, 23 de junho de 2022

Campeão Paraense em 1973 (Invicto)

CLUBE DO REMO - CAMPEÃO PARAENSE INVICTO EM 1973

Faziam cinco anos em que o Clube do Remo não conquistava o Campeonato Paraense. Depois do título invicto de 1968, o Mais Querido esteve muito perto de encerrar o jejum em 1971 e 1972, mas amargou vices contra o maior rival em decisões emblemáticas. Entretanto, a espera remista acabaria em 1973 com uma campanha esplendorosa. 

Vindo de uma bela apresentação no Campeonato Nacional no ano anterior, o Leão Azul credenciou-se como o grande time do estado, demonstrando isso dentro de campo ao sagrar-se mais uma vez campeão paraense de forma invicta. Os azulinos não deram quaisquer chances aos adversários, arrematando os dois turnos e, consequentemente, o título.

Ainda assim, é óbvio que a conquista não seria permeada por polêmicas - algo muito comum naqueles tempos. Na reta final da competição, o Remo, que já era campeão do primeiro turno, liderava a tabela de pontos, sendo seguido por Tuna, Sport Belém e Paysandu, em sequência.

Isso fez com que o último jogo da campanha, contra o Paysandu, no dia 12 de agosto de 1973, ganhasse contornos de dramaticidade, principalmente pela situação delicada do rival. Num Baenão superlotado, o Remo jogava melhor, mas era o Paysandu que vencia por 1 a 0. Isso até 22' do segundo tempo, quando o juiz José Luiz Barreto marcou um pênalti do listrado Diogo no azulino Augusto.

Os bicolores não aceitaram e iniciaram uma confusão, ainda mais inflamados quando Alcino foi comemorar a marcação da penalidade, chutando as redes adversárias. Nisso, o árbitro, sem esperar os 20' necessários, optou por suspender a partida e dirigiu-se com os auxiliares para o túnel onde estava a torcida do Paysandu. Acabou sofrendo um trauma facial provocado por uma garrafa de cerveja. A partida foi anulada e o episódio ficou conhecido como o "Domingo das Garrafadas".

"A Província do Pará", 14 de agosto de 1973

A remarcação do embate se deu dois dias depois, em 14 de agosto, novamente no Baenão, com policiamento reforçado e nova arbitragem. Dessa vez, o Leão aproveitou que o rival estava desfalcado - Prado, expulso no domingo anterior, antes da confusão, estava fora pela "Lei do Cão" - e venceu com autoridade por 2 a 1, gols marcados por Roberto aos 17' do primeiro tempo e Alcino aos 29' do segundo. Resultado este que alijou o Paysandu do campeonato. 

Gol de Roberto que sacramentou a vitória azulina no Re-Pa

Ao Remo, bastava um simples empate contra a Tuna no último jogo, no Baenão, dia 17 de agosto. E ele veio com 0 a 0 morno, mas suficiente para tirar o grito de campeão da Nação Azulina que estava há cinco anos entalado. A festa, justificada, foi tanta que perdurou por todo o fim de semana. O ponto negativo foi o falecimento de um torcedor na piscina da sede social durante a comemoração. 

Caíto comandou a festa da torcida

Interessante observar que mesmo com o sucesso dentro de campo, à beira dele nem sempre foi as mil maravilhas. O treinador Aloísio Brasil, devido a problemas no relacionamento com alguns jogadores, chegou a deixar o cargo, sendo substituído por Wilson Santos, mas retornou auxiliado por Cléber Camerinho e François Thym. 

Mas nem mesmo essa mudança no comando técnico atrapalhou a trajetória remista. Os números do Filho da Glória e do Triunfo provam isso: nove vitórias e três empates em 12 jogos, com 25 gols marcados e apenas três sofridos, que lhe garantiram os dois turnos e, consequentemente, o campeonato. De quebra, o Remo ainda teve o artilheiro do certame - Alcino, com sete gols.

O Primeiro Duelo Futebolístico entre Pará e Amazonas

É no distante ano de 1909 que acontece o jogo inaugural, na história, entre clubes de futebol dos dois maiores Estados da Amazônia brasileira, envolvendo as equipes do Brasil Football Club (de Manaus, capital do Amazonas) e o Sport Club do Pará (de Belém, capital do Pará).

Naquele ano Manaus ainda vivia o fausto econômico ocasionado pela exportação da borracha e,com uma intensa vida cultural,a sociedade amazonense,em suas horas de lazer,cada vez mais se dedicava às práticas esportivas. 

Trazido à capital do Amazonas pelos ingleses,o "Football" foi timidamente ganhando espaço e aos poucos desbancando a preferência do público local pelo turfe e ciclismo.

Em 1909,enfim,o futebol caía nas graças e na preferência dos manauaras de todas as classes sociais,tanto é que somente nesse ano são fundados em Manaus 18 clubes para a prática do esporte bretão.

Porém de todos esses clubes, o Racing e o Brasil eram os principais pois eram os de maior torcida, os mais competitivos e que continham os melhores jogadores do Amazonas. Os encontros entre Racing e Brasil era considerado a maior rivalidade do futebol amador amazonense daquele ano.

Belém era a outra capital do Norte que na época também usufruía da riqueza  proporcionada pela exportação gomífera. Na capital do Pará o futebol foi introduzido antes do quê em Manaus,inclusive o campeonato paraense já era disputado desde 1906. Haviam na cidade várias boas equipes de futebol que disputaram o certame estadual de 1908/1909, entre  elas o Pará Club, Belém Football Club, União Sportiva e, lógico, o Sport Club (que foi vice-campeão).  

A CHEGADA DOS JOGADORES PARAENSES

Mas, em abril de 1909, um grupo de jogadores vindos de Belém do Pará, desembarcava de um vapor no Porto de Manaus, alguns deles eram Arnaldo Andrade, Eirado Júnior, Djalma Machado, Campbell Pena e Tavares Cardoso.

Na cidade eles foram acolhidos por um conterrâneo seu chamado Luiz Paulino, um esportista paraense que residia em Manaus. 

Os atletas visitantes pertenciam ao Sport Club do Pará, veterana agremiação de Belém que foi o primeiro clube a praticar o futebol no Pará (em 1898) e disputava as primeiras edições do campeonato paraense. 

Já estando os jogadores visitantes devidamente alojados em Manaus, Luiz Paulino logo mandou uma carta para um jornal local,f azendo um convite de um amistoso de seus companheiros para com uma das principais equipes do futebol Baré em evidência naquele momento: o Racing. 

A diretoria do clube alvinegro manauara leu o convite e aceitou o desafio que ficou marcado para se realizar no dia 4 de abril, num domingo, na Praça Antônio Bittencourt (conhecida hoje como Praça do Congresso).

Mas para decepção dos atletas paraenses, no dia marcado para o jogo, a diretoria do Racing manda uma carta para os visitantes comunicando-lhes que não iam mais participar do encontro. Não se sabe o motivo que levou o clube amazonense a tomar essa decisão. 

Mesmo desanimados com a inesperada notícia, os paraenses não se deixaram abater  e,em cima da hora, resolveram lançar o desafio ao maior rival do Racing: o Brasil Football Club.

Naquele momento os jogadores do Brasil estavam fazendo um treino e aceitaram de bom grado realizar o jogo, afinal possuíam bons atletas como Pingarilho, Tancredo Costa e o inglês Huascar Purcell.

BRASIL  X  SPORT CLUB DO PARÁ  - JOGO INTERESTADUAL TERMINOU COM VITÓRIA PARAENSE

Era o dia 4 e abril de 1909 e a Praça Antônio Bittencourt (que era o campo oficial do Brasil) estava naquela tarde  com seus arredores completamente lotados, com grande presença  de populares e membros da elite. 

Precisamente às 17 horas o juiz inglês Bolivar Purcell dava início ao aguardado jogo, cabendo a saída ao Brasil, através do centroavante Huascar Purcell. 

O jogo se mantém equilibrado,a torcida apóia o time local, mas também aplaude os jogadores paraenses pelas suas certeiras combinações de passes e tática, mostrando que eram conhecedores a fundo do futebol.

Huascar, do Brasil, faz um passe para Compton (um outro britânico do time amazonense). Este, de posse da bola, avança para o campo do Sport Club. Mas Luiz Paulino, que seguia Compton de perto, consegue tomar-lhe a bola e,em disparada,vai levando a pelota e driblando os adversários quando, já próximo da trave do Brasil,desfere um forte chute marcando assim o primeiro gol dos paraenses. 

Recomeça a luta e os jogadores se batem com valentia,com a bola num instante prevalecendo  no lado do campo do Brasil e noutro estacionando no campo do Sport Club.

Compton e Huascar chutam várias vezes contra o gol do Sport Club, mas todas as tentativas são rebatidas pelo goleiro Djalma Machado.

Faltavam cinco minutos para acabar o primeiro tempo quando Luiz Paulino, Newton e Andrade,trocando passes,levam a bola para o campo do time amazonense.Já próximo do gol do Brasil,Paulino faz um passe para Newton e este,não estando numa posição firme, passou a bola a Andrade que com outro petardo assinalou o segundo gol do Sport Club do Pará. 

E assim, com a vantagem de dois gols do time visitante, terminava o primeiro tempo.

Depois de 10 minutos de descanso, reiniciava o jogo na sua etapa final. Mas, apesar das tentativas, não houve alteração do placar em seu segundo tempo, pois os jogadores se mostravam bastante cansados. Porém, Fernando Silva, do Sport Club, por pouco não fez um belo gol quando do meio do campo deu um forte chute, passando a bola por cima da trave do Brasil.

A partida terminou às 18 horas com a vitória do Sport Club do Pará por 2 x 0, um grande resultado adquirido no campo inimigo. A torcida ergueu diversos "vivas" aos jogadores dos dois clubes e a imprensa local classificou o jogo como o mais importante, até então, realizado no Amazonas. 

Somente a partir de 1918 que partidas de futebol entre amazonenses e paraenses voltaram a se realizar, sendo frequentes nos anos seguintes.

À esquerda se tem a foto, em 1909, de Ulysses Reymar,que foi quem fundou o clube amazonense do Brasil Football Club, sendo ele também membro da diretoria. À direita se tem a imagem do time do Sport Club do Pará, em 1912, contendo alguns jogadores que três anos antes estiveram em Manaus realizando o pioneiro jogo

Fontes: "Jornal do Commercio", jornal "O Amazonas".

Texto: Gaspar Vieira Neto (historiador amazonense).

terça-feira, 21 de junho de 2022

Os Primórdios do Futebol Paraense

O surgimento do futebol em terras paraenses é permeado de incertezas. Os registros mais antigos são escassos e inconclusivos, mas apontam que os primeiros jogos parecem ter sido disputados a partir do final do século XIX. O jornalista Ferreira da Costa em seu livro Parazão Centenário (2012) fez um compilado desses indícios, com citações da prática do esporte entre 1890 e 1896. Essa última data é corroborada pelo historiador Ernesto Cruz, na sua obra "História do Clube do Remo" (1970), que traz ainda uma nota do jornal "Folha do Norte", de 24/12/1903, assinada pelo leitor "M. F.", que diz o seguinte: 

"(...) em 1896 se disputavam, por iniciativa da Associação Dramática e Recreativa e Beneficente, várias partidas de futebol, na praça Batista Campos...".

Pedro Brandão, em seu trabalho As primeiras formas de organização do futebol em Belém do Pará (1896-1910), encontra como registro mais antigo do futebol paraense uma nota do jornal Folha do Norte, de 30/07/1898, noticiando que a diretoria do Sport Club do Pará estaria organizando uma partida para o dia seguinte. Ferreira vai ao encontro dessa informação, destacando ainda que esse seria o primeiro time paraense de futebol, fundado por La Rocque e outros, que jogaria contra um time de ingleses no campo da Praça Floriano Peixoto.

Em 1906 ocorreu a tentativa inicial da realização de um campeonato, que seria organizado pela Pará Foot-Ball Association League, e disputado em turno único. A primeira partida se deu em 16/12/1906 entre os times do Pará e do Belém. Porém, devido às divergências entre os participantes, a competição foi suspensa no mês de junho de 1907 e não teve a sua conclusão. 

Representação do time do Belém Foot-Ball Club. Fotografia de uma das edições da revista portuguesa "Tiro e Sport" em 1907, colorizada por Marcos Paulo Darcheville

Em 19/08/1908, fundou-se a Liga Paraense de Foot-Ball. Essa, por sua vez, teve êxito e conseguiu organizar o primeiro Campeonato Paraense da história, vencido pelo União Sportiva, que recebeu a Taça Pará. O Sport Club do Pará foi o vice. Em 1909, o campeonato não foi disputado, retornando em 1910, tendo novamente o União como seu ganhador. Pouco se sabe dos detalhes dessa conquista, apenas de citações posteriores, a exceção de uma rica matéria da revista portuguesa Tiro e Sport, de 15/07/1910 sobre a abertura oficial do campeonato, em 13/05.

Imagens raras da revista portuguesa Tiro e Sport, colorizadas por Marcos Paulo Darcheville. Acima, observa-se o Dr. Elyseu Cezar declarando inaugurada a Liga Paraense de Foot-Ball. Abaixo, aquele que talvez seja o primeiro registro fotográfico de uma partida de futebol no Pará, entre os times do Instituto Amazonia (branco) e Gymnasio Paes de Carvalho (escuro) na Praça Floriano Peixoto, válido pelo campeonato acadêmico. Esse jogo precedeu a partida entre Sport Club do Pará e Panther Foot-Ball Club

Vale ressaltar que desde meados de 1850, era muito forte a influência europeia na cidade de Belém, sobretudo dos ingleses, que passaram a comandar setores-chave da cidade, como as companhias de navegação e energia, fenômeno impulsionado pelo Ciclo da Borracha na Amazônia (1879-1912). Belém vivia a sua chamada belle époque, na qual experimentou várias mudanças não apenas infra-estruturais, como também multiculturais. Era comum, por exemplo, que os jovens de famílias da elite fossem estudar na Europa. Essa onda facilitou a entrada de Belém como uma das primeiras capitais brasileiras a desenvolverem o esporte.

Aliás, é interessante destacar como a influência inglesa estava presente também nos meios de comunicação. Sem ainda possuir uma identidade própria, o futebol era referenciado com palavras de sua língua materna. Os jogadores eram chamados de footballers, os zagueiros de backs, os meio-campistas de center-half, os atacantes de forwards e por aí vai. Os matchs (jogos) e trainings (treinos) eram organizados pelos capitain (capitães) dos teams (times). 

Em seus primórdios, o futebol, assim como qualquer outro esporte, ainda era praticado de forma amadora, como uma atividade de lazer. Ainda não havia a ideia de profissão, logo os times eram formados por jogadores que trabalhavam em outras áreas, tais como médicos e advogados, geralmente restrito aos segmentos mais elitizados. Como não precisavam ficar a maior parte do dia trabalhando, esses homens podiam até mesmo se dedicar à prática de diversos esportes, como o remo, a natação e o turf (corrida de cavalos). Esses desportistas ficaram conhecidos como sportman, sendo cultuados pelo seu privilégio físico e social.

segunda-feira, 20 de junho de 2022

Bicampeão do Norte em 1969

CLUBE DO REMO — BICAMPEÃO DO NORTE EM 1969

Ainda com a primeira conquista totalmente viva na memória dos azulinos, o Clube do Remo ingressou no Torneio Norte-Nordeste de 1969 disposto a manter a hegemonia regional, apenas sete meses após obtê-la. Novamente sob a égide da Confederação Brasileira de Desportos — CBD —, a segunda edição do "Nordestão" apresentou algumas mudanças. 

O lado “Norte" foi organizado em dois grupos conforme a proximidade geográfica dos estados participantes e estes, por sua vez, em quatro subgrupos. Os times de cada grupo jogavam entre si e os primeiros colocados formariam um quadrangular que decidiria o campeão do Norte. Portanto, assim se deu a disposição inicial dos disputantes:

Grupo 1:

Subgrupo A (PI): Flamengo, River e Piauí.

Subgrupo B (MA): Ferroviário, Sampaio Corrêa e Maranhão. 

Grupo 2:

Subgrupo A (PA): Remo, Tuna e Paysandu.

Subgrupo B (AM): Nacional, Olímpico e Fast.

A estreia do Clube do Remo ocorreu no dia 24/09/1969, quando perdeu o clássico para a Tuna por 1 a 0. Todavia, essa seria a única derrota azulina na primeira fase. Nos outros jogos, o Leão somou oito vitórias e apenas um empate, classificando-se com sobras no seu subgrupo — 17 pontos contra 12 da Tuna e 11 do lanterna Paysandu —, com direito à vitória de 1 a 0 no Re-Pa que finalizou a sua campanha, no dia 09/11. Os demais classificados foram Nacional, Flamengo-PI e Ferroviário-MA. 

Com o quadrangular decisivo formado, o Leão começou com tudo. Venceu o Flamengo por 1 a 0 e o Ferroviário por 2 a 0, ambos fora de casa. No primeiro jogo em seus domínios, empate sem gols com o Nacional. Na virada do turno, recuperou-se ao vencer o Flamengo por 2 a 0, em casa. Nessas condições, o Remo somava sete pontos, contra cinco dos demais adversários, necessitando de apenas mais um ponto nas partidas remanescentes para confirmar o bi.

A própria imprensa de fora, já dava como certo o título azulino, conforme evidenciado no Jornal do Commercio (AM), do dia 05/12/1969: "Remo precisa de um empate para classificar-se — O Clube do Remo, após a vitória de quarta-feira, diante do Flamengo, do Piauí, garantiu praticamente o título de campeão do Norte, pela segunda vez, a não ser que venha a perder seus próximos compromissos frente ao Ferroviário, domingo, e na vindoura quarta-feira, diante do Nacional".

Entretanto, o improvável aconteceu. Na data de 07/12, uma surpreendente derrota para o Ferrim maranhense por 2 a 1, no Baenão, adiou a festa dos azulinos, que esperavam comemorar em casa o bicampeonato. Com o revés, o time maranhense voltou à briga, deixando tudo para a última rodada.

A Província do Pará, 10/12/1969

Mesmo assim, a vantagem do empate permanecia para o jogo derradeiro, em 10/12/1969. Entretanto, ela praticamente foi por água abaixo quando o Nacional abriu 2 a 0 no placar, se aproveitando da atuação desastrosa do time remista e principalmente do zagueiro Carvalhão,  com sucessivas falhas, tornando a defesa azulina um verdadeiro buraco. Concomitantemente, o Ferroviário-MA vencia o Flamengo-PI no Maranhão pelo mesmo placar, empatando em pontos com o Remo (sete) reduzindo a diferença no saldo de gols para dois.

Diante disso, o campeoníssimo técnico Danilo Alvim resolveu sacudir a equipe no intervalo. Colocou Edilson no lugar de Carvalhão e sacou Íris, que estava totalmente apagado. As medidas surtiram efeito e o Clube do Remo impôs uma extraordinária reação, alcançando o tão almejado empate graças à estrela de Zequinha, que marcou aos 20' e aos 40' do segundo tempo, dando números finais ao jogo. Não havia mais jeito! Nem a consumação da vitória do Ferroviário contra o Flamengo tirava mais o titulo remista. 

No dia seguinte, A Província do Pará decretou: “CLUBE DO REMO — BI-CAMPEÃO DO NORTE! — O Clube do Remo sagrou-se bicampeão do norte, no NN-69, ao reagir e empatar de maneira sensacional com o Nacional, ontem, à noite, em Manaus não dando chance assim que a decisão fôsse pell goal-average, como tudo parecia crêr”. Segundo a publicação, o Clube do Remo jogou com: François; Mesquita, Nagel, Carvalhão (Edilson) e Lúcio; Angelo e Carlito; Birungueta, Íris (Osmar), Zequinha e Neves.

A Província do Pará, 11/12/1969

Já O Liberal expôs: "DEU BI EM MANAUS — (...) Todavia, no segundo tempo, deu-se a reação do Clube do Remo; a equipe 'azulina' entregou-se à luta com brio, com muito ardor, com firmeza, na medida em que o time da casa ia caindo de produção, convencido de que tinha a vitória assegurada. E vieram os dois goals de Zequinha, ambos fruto da insistência dos 'azulinos' em desfazer a desvantagem dos 'nacionalinos'. E foi o empate e com êle o título de bicampeão do Norte, sem a necessidade de recorrer à diferença de goals".

No entanto, a temporada azulina só encerraria de fato no dia 14/12/1969, quando o Leão disputou um Re-Pa festivo, no qual seriam entregues as faixas de bicampeão do Norte ao Clube do Remo e de campeão paraense ao Paysandu, no Baenão. O Filho da Glória e do Triunfo venceu por 2 a 0, gols de Robilotta e Neves, mostrando que "NO CLÁSSICO DAS FAIXAS LEÃO FOI MAIS CAMPEÃO", como evidenciou A Província do Pará, de 16/12/1969.

A Província do Pará, 16/12/1969

* Esse texto foi feito com base nas pesquisas de Adenirson Olivier (Cultura de Remo), Felipy Chaves (Enciclopédia do Leão) e Joaquim Rangel (Azulinos da Cidade).